"Adília Lopes e os novos caminhos
da poesia portuguesa"
Conferência da professora
Ana Bela Almeida
(Universidade de Liverpool)
Quinta-feira, dia 12 de Novembro, 13.00 horas
Auditório ('Salón de Actos')
da Facultade de Filoloxía e Tradución
da Universidade de Vigo.
Adília Lopes introduziu na poesia portuguesa do último quarto de século uma ideia tanto estética como subversiva do quotidiano, a qual se aproxima da indiferenciação entre vida e arte. Uma obra de arte total, já não num sentido modernista e elitista, mas numa acepção democratizada:
"Trata-se de uma obra metaliterária, que reflecte sobre o seu próprio sentido e estrutura [...], no decorrer da qual se vai construindo uma autobiografia literária, como uma personagem heteronímica que se dedicasse a constantemente re-escrever a própria história. A escritora de carne e osso (a que dá entrevistas e vai à televisão) faz parte do jogo e serve os propósitos ou caprichos da personalidade/personagem literária que, na obra, se desdobra [...], num baile de máscaras sempre múltiplo e sempre in progress." (Almeida & Baltrusch 2007).
Na sua agora já vasta obra, tem vindo a adoptar, ao longo do tempo, sobretudo nos seus últimos livros (Manhã e Comprimidos, 2015), uma escrita cada vez mais breve e concentrada.
Já tem sido comparada, até, com a poeta galega Lupe Gómez:
"Em última análise, a Literatura e a Arte em geral, nos dedos de Lupe Gómez e Adília Lopes, são conceitos que vivem na e da corda bamba e nunca como definições estáticas/estáveis para nossa falsa comodidade. Neste sentido, revemos os versos de Adília Lopes:
“a poetisa é a mulher-a-dias / arruma o poema / como arruma a casa / que o terramoto ameaça, a entropia de cada dia / nos dai hoje / o pó e o amor / como o poema / são feitos / no dia a dia” e, mais adiante, “graças ao amor / e ao poema / o puzzle que eu era / resolveu-se / mas é preciso agradecer o pó / o pó que torna o livro / ilegível como o tigre” (Mulher-a-dias, 2002).
O pó é necessário à função de mulher-a-dias, tal como é necessário à de poeta. O pó é o elemento que altera/desordena as coisas e existe, como o amor, ou mais que o amor, para sempre. Ambos existem no dia-a-dia e não nalgum momento sublime, fora do tempo. É no combate incessante entre o amor e o pó, o belo e o feio, a ordem e a desordem, a arte e a vida, que a literatura encontra o seu (não) lugar.
“A mulher-a-dias sou eu, é qualquer pessoa” (ibid.) – podiam tê-lo dito artistas como Joseph Beuys, Ben Vautier ou Cindy Sherman. Será interessante pensar em Adília Lopes e Lupe Goméz como as mulheres-a-dias das literaturas galega e portuguesa. Aquelas que fazem o dirty job, aquilo que os outros não querem fazer, mas que tem que ser feito. As que estão na sombra, mas sem as quais a instituição não funcionaria. As que trabalham para permitir aos outros o descanso. As que não têm medo de sujar as mãos. Tal como o pó, que nunca se limpa, mas que se vai limpando, também a revolução em literatura, como fica demonstrado, é algo que nunca se faz, mas que se vai fazendo, a cada livro, a cada verso." (Almeida & Baltrusch 2007)
Ana Bela Almeida, professora de língua e literatura portuguesa na
Universidade de Liverpool, é uma das principais especialistas na obra de
Adília Lopes na actualidade e foi pioneira ao compará-la com a poeta galega
Lupe Gómez (já em 2004, na sua tese de mestrado sobre Representações do Corpo da Mulher nas Obras de Paula Rego, Adília Lopes e Lupe Gómez), sobre a qual publicou vários estudos e que traduziu ao português. Na actualidade, está a terminar a sua tese de doutoramento sobre "Animalidade e especismo na obra de Adília Lopes" e publicará em breve o livro Introdução à obra de Adília Lopes.
Este blog já dedicou vários posts tanto à obra como à recepção de Adília Lopes.